O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) convocou um ato para este domingo (25/05), às 15h, na Avenida Paulista, em São Paulo. Atendendo a um pedido do ex-presidente, que chegou a postar um vídeo nas redes sociais, aliados políticos desistiram de eventos nas cidades onde vivem e confirmaram presença em São Paulo. Ontem, o governador Romeu Zema, de Minas Gerais, anunciou que participará da mobilização pró-Bolsonaro na capital paulista.
Pelo menos outros três governadores estarão na Paulista: Tarcísio de Freitas (Republicanos), de São Paulo; Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás; e Jorginho Mello (PL), de Santa Catarina.
No entanto, o ex-chefe do Executivo deverá adotar um discurso com tom ponderado. A análise é de especialistas ouvidos pelo Correio, que apontam que o objetivo é mostrar que mesmo envolto em embaraços, Bolsonaro dispõe de capital político e capacidade de mobilização de sua militância.
O cientista político Murillo Aragão, da Arko Advice Pesquisas, destaca que o objetivo é mostrar ao mundo político e jurídico, como Bolsonaro mesmo disse, "uma fotografia" de sua popularidade.
"Bolsonaro usa e abusa da ambiguidade. Creio que o discurso terá mensagens contraditórias de agressividade e respeito aos poderes. Se comparecer um bom número de pessoas, será muito bom politicamente para ele. Acho difícil que ele seja preso, mas terminaria sendo 'positivo' para ele como vítima de perseguição política. Um preso político", diz.
"É sempre um movimento arriscado. Mas a expectativa é de um comparecimento robusto. O resultado efetivo é que ele vai mostrar força política, que continua tendo apoio e engajamento dos apoiadores, reforçando seu nome como principal antagonista e opositor contra o atual governo."
"Ele quer mostrar que continua sendo uma liderança importante e serve para uma construção de narrativa. Vimos outras figuras políticas seguirem nessa mesma direção, quando Lula fazia ato e criticava, por exemplo, a Lava-Jato. É um padrão de comportamento de figuras públicas que se veem, de alguma forma, ameaçadas." Para o cientista político, Bolsonaro deverá adotar um tom menos belicoso do que está acostumado a fazer. "Deve rebater as acusações e dizer que nunca tentou dar golpe", acredita.
O advogado de Bolsonaro, Fabio Wajngarten, afirmou, na semana passada, que a expectativa para o ato "é a melhor possível" e que o ex-líder do Executivo "terá uma grande oportunidade de fazer um balanço do seu governo, uma retrospectiva". "Vai falar do momento dele passadas as eleições e vai falar de Brasil para frente, o futuro do Brasil e dos brasileiros. Essa é a perspectiva para domingo", comentou, em coletiva, após o depoimento do ex-presidente à Polícia Federal, no último dia 22, no inquérito que investiga uma tentativa de golpe de Estado e no qual Bolsonaro se manteve em silêncio.
Para o ato, são esperados 100 deputados, e de 10 a 15 senadores. O público aguardado é entre 500 mil e 700 mil pessoas.
A Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP) informou que o ato contará com esquema reforçado de policiamento. Serão cerca de 2 mil agentes a postos. Também estarão disponíveis para o monitoramento de eventuais ocorrências drones do sistema olho de águia e câmeras fixas e móveis.
Bolsonaro pediu que os apoiadores façam uma manifestação "séria, disciplinada e pacífica" e que não ocorram outros atos simultaneamente fora da capital paulista.
Geraldo Tadeu, cientista político da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), ressalta que o ato serve como forma de "pressão" para medir força com as investigações na PF. "É uma tentativa de reagir às investigações de uma maneira política, de embaraçar ou dificultar essa manifestação da Polícia Federal a partir da demonstração de força de Bolsonaro e dos seus correligionários."
Ele observa que a manifestação será um termômetro do debate político em torno do inquérito sobre o golpe pelos próximos meses. "Caso Bolsonaro e seus correligionários sejam capazes de pôr na rua um número significativo de pessoas, demonstraria força política ainda resistente em torno de sua figura. Caso as manifestações não tenham a adesão esperada, veremos o desmonte do bolsonarismo enquanto movimento político uma vez que Bolsonaro está inelegível", avalia.
"Não acredito que Bolsonaro vá escalar as declarações. Quando era presidente, tinha imunidade. Agora é um cidadão comum que está sofrendo um processo judicial sob o bastão do ministro Alexandre de Moraes", opina.
Na visão da professora de Ciência Política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Mayra Goulart, a manifestação na Paulista objetiva mostrar que o avanço das investigações pode gerar instabilidades sociais no país.
"O sentido é desestimular o progresso das investigações, arrefecer, mostrar que o presidente tem muito apoio e que, caso as investigações avancem, elas podem gerar turbulências reais."
Apesar de bem orientado pela defesa, Goulart destaca a personalidade imprevisível de Bolsonaro, que pode se deixar levar pelo calor do momento.
"Bolsonaro está sendo bem orientado a não elevar as declarações, mas ainda assim, pode se empolgar e cruzar linhas que podem ser desfavoráveis."
A advogada constitucionalista Vera Chemin, mestre em direito público administrativo pela Fundação Getulio Vargas (FGV), expõe que o evento terá consequências preocupantes, caso o ex-presidente extrapole.
"Ele já sabe que não pode escalar as falas em hipótese alguma, sob pena de ser objeto de novas representações e sanções civis e penais. Creio que ele tomará cuidado com as palavras e gestos no evento."
Ela corrobora que, com o ato, Bolsonaro também será cabo eleitoral e dará palco a aliados que pretende emplacar nas cidades e municípios do país.
"A ideia é aprofundar os laços com os seus apoiadores e simpatizantes por conta da sua situação na Justiça e o próximo pleito eleitoral municipal", conclui.