Por Luís Alexandre Rassi*
No século passado, saber o nome dos ministros do Supremo Tribunal Federal não era algo de conhecimento dos leigos. Conhecer seus posicionamentos era algo inimaginável para os não iniciados.
A jurisprudência era algo imutável, concebida em linhas legais, não havia em qualquer oportunidade uma modificação para atendimento de interesses sociais, interesses políticos ou circunstâncias temporais.
Os Ministros atendiam advogados, às vezes até em casa, havendo a necessidade de um provimento no plantão. A postura, o respeito e a liturgia ensejavam um temor referencial (o receio de desagradar alguém a quem se deve respeito e obediência) àquelas autoridades.
Hoje se escreve sem receio sobre o Supremo Tribunal Federal. A favor e contra. O Excelso virou um personagem da crise política. Isso começou com o Mensalão.
No mensalão, em um ambiente já televisado, o então Ministro Joaquim Barbosa, um showman, soube aproveitar todo a repercussão midiática para fazer valer suas ideias. Fez justiça (com letra minúscula) em sua concepção. Entre a Lei e a Justiça, definiu o Supremo Tribunal Federal pela Justiça.
Muitos aplaudiram.
Irreversível a situação, naquela comoção social, o autor convidou para seu escritório o querido José Dirceu para lá trabalhar e na adequação à situação recebeu o ex-deputado federal João Paulo Cunha.
Durante todo o cumprimento da pena de João Paulo Cunha, o autor conviveu com toda a esquerda. Na época, por não haver clima, João Paulo Cunha almoçava na mesa de reunião do escritório. Era complicado, sair para almoçar.
Neste contexto, muitos dos que hoje aplaudem o Supremo Tribunal Federal, por lá passaram. Isto é dito para entregar ao leitor que a crítica ao Supremo Tribunal Federal independe de posicionamento político.
Hoje o Supremo Tribunal Federal erra mais do errou naquela época e o pior, ninguém com um conhecimento jurídico diz.
Um Ministro que é vítima de uma trama ardilosa para ter sua vida ceifada, comanda a investigação, decide sobre prisão de seus pretensos algozes e ao final, julga àqueles que seriam integrantes daquele complô contra sua vida.
Em nenhum lugar do mundo, em nenhum sistema legal em nenhuma Corte isso seria possível.
A imprensa, o povo (alguma parte dele) e os juristas legitimam esta atuação. Outros se revoltam violentamente e enfim, entra-se em ciclo vicioso onde a razão, o Direito e legalidade não vigoram.
Irônico que os que aplaudiram o Mensalão, a exceção de Valdemar da Costa, hoje colhem os frutos daquele rompimento institucional da vigência da Lei. Intrigante que aqueles que sofreram com Mensalão, não visualizem que a história é cíclica e que a ausência de limites atinge em um momento Chico e em outro Francisco.
Aqui não se defende criminosos, quer de esquerda ou de direita (apesar destes limites não serem bem concebidos no Brasil), defende-se Direitos e Garantias. Limites, pesos, contrapesos e o devido processo legal, asseguram a Justiça, independente do lado em que estamos.
As vezes é preciso voltar aos clássicos do passado para compreender a realidade do presente.
A Carta Magna, criada em 1215 foi estabelecida para submeter o tirânico rei João Sem Terra aos limites da Lei. A Grande Carta foi um ponto de viragem na luta pela liberdade e um marco no desenvolvimento da democracia moderna ao estabelecer entre outros princípios:
1 – O direito a habeas-corpus, ou seja, o direito de um cidadão ser julgado antes de ser preso
2 – O princípio da presunção de inocência
3 – Os princípios do devido processo legal e da igualdade perante a lei
4 – O princípio do contraditório
5 – O princípio da ampla defesa
É isso que tem que ser assegurado. É esta luta que se deve ter todo operador do Direito.
*Luís Alexandre Rass é advogado